sexta-feira, 17 de junho de 2011

Homem dormindo


Lembranças chuleiam as alegrias puídas do nosso amor.
Recordo a cama tão pequena, o quarto tão pequeno, o mundo tão pequeno.
Pernas e promessas entrelaçadas
À bendita desordem de nossas bocas e braços.
Ancas confrontadas,
Em gozos, confortadas...
E nós dinamizados, transbordantes,
Tão aliados e tão amantes,
Apostando em tudo,
Jurando verdades,
Mentiras distantes...

Ah, se algum vidente tivesse me avisado,
Como enganaria o tempo para perpetuar nossas entregas?
Talvez ousasse o meu sorriso mais bonito,
Despisse a minha roupa preferida
E fugisse acenando meus cabelos ao vento,
Sem volta,
Sem revolta,
Sem olhar para trás,
Solta,
Numa corrida enlouquecida.

Assim, como tudo o que vive por miúdo tempo,
Deixaria uma saudade imensa,
Desconfortante,
Movediça.
Desconcertante,
E jamais seria esquecida...
(autora: Cris Lopes)

sábado, 11 de junho de 2011

Avesso



Amanheço com sabor de menta e café;
Adormeço com cheiro de camomila e malva.
Há muito aprendi o prazer dos gostos simples,
A sedução dos cheiros naturais,
Degustar a vida em canecas fumegantes:
Cascas de laranjas, calda de ameixas, cravos e canela.
Acariciar a terra com olhares e dedos.
Plantar, replantar...
Debulhar segredos,
Dedilhar o sol pelas frestas da janela,
Descortinar cores e flores.
Saber do tempo que o ar anuncia,
Vibrante movimento,
Seguir como as velas,
Entregues ao vento...

Sorrisos e Portas.
Mãos e Camas.
Pernas e Fugas.

A beleza de flor
A rosa revela
Do avesso...

Já deixei roupas sem amasso,
Arranquei roupas ao acaso.
Vestida ou nua,
Amada ou amordaçada tantas vezes
Pelos egoístas e mentirosos em seus currais,
Sou eu, livre, que danço a música dos temporais.
Sou eu, sozinha, que rodopio com a chuva no quintal...
Trovões:
Saravada,
Sacudo maldições.
Sou eu que cuspo na cara do mal,
Vitória decretada!
Vivo minhas histórias,
Abandono o que não mereço.
Sem olhar para trás,
Despasso,
Despacho,
Desfaço
E do avesso, amanheço.
Amanheço do avesso:
Frases,
Faces,
Fases,
Sempre mulher
Sou eu...
(autora: Cris Lopes)

Ser Ator


(Passeio de Marc Chagall)

Se viver é amar,
Ser ator é ganhar vidas,
Vidas emprestadas,
Que desejam ser contadas;
Histórias veladas,
Reais ou inventadas,
Desnudadas mesclam
Mentiras e liras.

Ser ator é apropriar-se sem rodeios,
Improvisar ou seguir roteiros,
Sacudir, revelar, bagunçar
Emoções escondidas,
Guardadas, esquecidas...

Ser ator é dar vida
À vidas não escolhidas:
Vidas alegres,
Vidas doídas!

O talento, se verdadeiro,
O dom vibra,
Flui por fibra.
Requer coragem,
Sedução,
Memória,
Disciplina,
Malandragem...

Ser ator é se entregar por inteiro:
Possuído ou
Conquistado.
Ser herói ou bandido,
Amado ou traído,
Eternizado ou esquecido.
Pobre ou rico há de brilhar
E ser intenso- calmo ou tenso.
Provocar sorrisos ou prantos.
Iludir, seduzir com seus encantos.
E a magia,
A veia de representar é como a da vida:
Desponta,
Desaponta,
Transborda,
Transforma,
Sem limites, convida...
(autora: Cris Lopes)