A educação brasileira está doente,
que me desculpe o atual ministro da educação, Sr. Aloizio Mercadante e todos os
seus antecessores. Quando li uma reportagem sobre as metas e problemas
apontados pelo ministro e especialistas (Sr. Antônio Freitas, Sr. Roberto
Salles, Sra. Priscila Cruz) me surpreendeu o fato de ninguém mencionar três
questões prioritárias. E se ainda não foram identificadas, não podem ser
solucionadas. Começo citando a necessidade de reformular o ensino para que seja
inteligente, eficiente e prático. O aprendizado encerra basicamente conteúdos
culturais e informativos. Cultura nunca é demais, pois enriquece o espírito e
auxilia a vida. Já os programas dos conteúdos informativos são extensos e, em boa
parte, inúteis. Assim, professores tentam “se virar” nos tempos de aulas para
dar uma “quantidade” exorbitante de matéria que só vem aumentando, ao longo dos
anos, enquanto os alunos precisam processar essa quantidade absurda com
eficiência para serem "bem sucedidos" nos exames.
Diante do que é
oferecido ao aluno como “ensino”, muitos desistem e ouso dizer que não são
delinquentes, vagabundos ou preguiçosos. Desistem porque são inteligentes.
Desistem porque sabem que para estudar tanta matéria haverá pouco tempo para
VIVER. E que inteligência sacrifica a diversidade de possibilidades
interessantes que a vida oferece para "aprender" tanta inutilidade?
Há os que se cobram mais do que se permitem e se curvam, assumindo suas tarefas
maçantes. O pouco tempo que lhes resta para outras atividades aliado ao estresse
da cobrança lhes rouba a alegria. Isso é saudável? É urgente repensar esse
modelo de ensino arcaico!
Há tantos ensinamentos interessantes que podem ser
valorizados. Pode-se aprender sobre economia doméstica, mercado financeiro, culinária
ou qualquer informação que favoreça ou auxilie de algum modo a vida das pessoas.
Logaritmos, frequência de onda, tabela periódica e tantas outras aulas que
deixam alunos “doidos” para depois serem esquecidas. Excepcionalmente, esses
conteúdos complexos serão empregados pelos que fazem escolas superiores ou
profissionalizantes. Portanto, são nesses patamares de formação que devem ser
ensinados, porque serão aplicados e úteis. Para os outros, perder tanto tempo
para aprender inutilidade é adoecer a inteligência!
Será que as pessoas
organizadoras do ensino brasileiro acreditam que quantidade produz genialidade? Ao
contrário, percebo que quanto mais avalanches de conteúdos desnecessários são
jogadas sobre os estudantes, menos eles demonstram interesse e prazer em
aprender. Estudar se transformou num fardo, numa obrigação, numa decoreba
gigantesca!
O acesso às universidades é o
momento de clímax do stress. É quando se intensificam as queixas físicas e
emocionais que acompanham todos os tipos de alunos- cefaléia, dorsalgia,
insônia, gastralgia, taquicardia, diarréia, alterações do apetite,
irritabilidade, angústia e muitas outras. Quanto a saúde do professor, posso
garantir que há grande comprometimento da qualidade de vida do educador sob a
análise de vários contextos. Como médica há 30 anos posso declarar que as
causas predominantes das consultas dos professores, que buscam tratamento em
meu consultório, são emocionais e revelam diferentes graus de comprometimentos
da saúde, principalmente na esfera mental.
Pais, alunos e toda a comunidade
escolar precisam se organizar e buscar lideranças representativas. É necessário
que, através de projetos legitimados, esses problemas sejam colocados em pauta.
O governo precisa repensar e criar comissões de revisão dos conteúdos
programáticos do ensino brasileiro. Precisamos de novas diretrizes. para que o
ensino seja inteligente e útil. A desvalorização de matérias interessantes como
filosofia, sociologia e arte ainda é observada e pode ser constatada pela oferta
de horários mínimos na grade escolar e pela contratação de professores sem a
devida formação.
Há escolas com lideranças criativas
que driblam os conteúdos informativos estabelecidos. Nelas, encontramos alunos
que gostam de estudar, porque aprendem com prazer. Seus arsenais individuais,
seus talentos e pensamentos são valorizados. Contudo, quando o processo escolar
se aproxima das provas de acesso ao ensino superior, surge o problema de que
essas propostas enriquecedoras e inteligentes não suprem a cobrança da matéria
inútil que abunda e garante o acesso ao ensino superior através do vestibular.
Ter prazer em estudar deve ser a regra e não a exceção. Ninguém deveria ser
punido por vivenciar essa experiência com uma reprovação. Até quando seremos
obrigados a alinhavar e remendar um modelo que não nos serve mais?
A outra grave questão, em minha
opinião, está situada extra muro escolar e representa duas prioridades perturbadoras
relacionadas às famílias brasileiras. A primeira delas é quem cuidará de seus
filhos pequenos enquanto trabalham e a segunda é depois que seus filhos já são
adolescentes, o que ficam fazendo enquanto seus pais cumprem suas jornadas de trabalho.
É preciso que o Estado se atualize e se comprometa com a condição atual da
sociedade que projeta a mulher no mercado de trabalho e que, muitas vezes, faz
dela a única responsável pelo provimento familiar. É possível solucionar essas
questões com a implantação de creches, de escolas públicas integrais. Falta
verba para isso? Que seja criado um imposto participativo da reforma
educacional, aplicável conforme o ganho de capital anual de cada empresa que
lucra com o Brasil, afinal uma boa educação é o que há de melhor em termos de
investimento para o futuro.
Finalmente, saliento que acredito
na necessidade de que a educação seja compreendida como meio capaz de estimular
as potencialidades individuais criativas, de promover o exercício da cidadania
nas suas diversas esferas (políticas, econômicas, sociais, ambientalistas) e de
propiciar a realização de práticas esportivas, permitindo o seu desenvolvimento
até mesmo à condição profissional. É preciso reformular o aproveitamento do
tempo escolar entre “conteúdos”, realização de tarefas escolares, atividades
físicas e participação de oficinas conforme aptidões-oficinas de teatro,
música, canto, culinária, artesanato, artes plásticas. As oficinas podem se
gerenciar através da venda de seus “produtos” (ex: ingressos, feirinhas) e
assim, ampliar os horizontes de novas diversidades. Parece fácil. E por quais
razões não é? É preciso tanta coisa possível, no entanto falta...
(autora: Cris Lopes)